Trata-se de uma pesquisa de cunho poético com base em uma escrita criativa acerca de um objeto específico, fundamentando-se nas metodologias das narrativas de formação em Tourinho e Martins (2017) e nas possibilidades de pesquisa cartográfica, por meio de mapeamentos afetivos e criação de territórios comuns, partindo como pressuposto os escritos de Kastrup e Passos (2013).
A proposta das narrativas de formação entende que o ato de narrar a si mesmo é um exercício formativo, entende-se aqui uma necessidade de revisitar a história de si próprio para compreender a fundo aspectos que compõem a formação pessoal, considerando uma relação entre memória afetiva, o presente e o futuro. Tourinho e Martins (2017) descrevem que a “[...] narrativa tem como foco a experiência humana, busca que sempre envolve ações cognitivas e afetivas, entrecruzadas. (p. 153)”. Em definição, podemos colocar que:
[…] a narrativa é uma forma de registro e compreensão de aspectos da experiência. Ela tem como agenciamento histórias vividas e contadas que possibilitam mediações entre o pensamento, ação, contexto, circunstância, presente passado futuro, ressaltando os elementos que reconstrói e tecem significados entre história individual e social dos indivíduos. (p. 156 - 157)
Desse modo, entendo que analisar a minha relação pessoal e da minha família com este objeto que cerca a nossa história, faz-se necessário no âmbito de narrar a mim mesma como forma de expor questões sensíveis que envolve todo o acervo de fotografias e vídeos armazenados no computador. Trata-se de um exercício formativo. Coloco-me à disposição para compreender as delicadezas desse acervo, entendo o computador como o fio condutor da minha narrativa. Assim, considero a cartografia como abordagem metodológica concomitante à narrativa de formação. Entendo que nesta investigação, ambas complementam-se. Em Kastrup e Passos (2013) temos que:
A pesquisa cartográfica faz aparecer o coletivo, que remete ao plano ontológico, enquanto experiência do comum e, dessa maneira, é sempre uma pesquisa-intervenção com direção participativa e inclusiva, pois potencializa saberes até então excluídos, garante a legitimidade e a importância da perspectiva do objeto e seu poder de recalcitrância. (p. 266)
Intervenho no meu ser quando coloco-me em frente às memórias do meu ser criança. Reorganizar essas memórias em novos territórios relaciona-se com uma prática cartográfica: do computador surgem novas narrativas sobre o meu próprio ser. Desse modo:
O método cartográfico propõe que se trabalhe com o entre, sugere que a pesquisa acontece no que se vivencia entre o pesquisador e o território de pesquisa. O que vive um pesquisador-cartógrafo, reside exatamente no ato de cartografar o que é móvel, o que não é estático: ele captura o entre, em seus campos de abrangência. (Richter e Oliveira, 2017, p. 30)
Para cartografar, é necessário compreender o objeto enquanto potência. O computador neste contexto revela-se enquanto potencialidade de reflexão poética e formativa. Desse modo, procuro expor, neste trabalho investigativo, parte das reflexões que foram desenvolvidas partindo do acesso à esse objeto, suas particularidades e desdobramentos. Mais uma vez, compreendo meu trabalho enquanto um exercício formativo e de compreensão identitária concomitante à uma análise cartográfica.
Em síntese, repito a necessidade de estar à disposição para acessar este lugar que pode ser sensível para mim: não posso voltar no tempo. Não dá pra voltar no tempo. Mas compreendo a possibilidade de entendê-lo como potência de criação de um novo território a ser habitado, agora no presente.